Até o final da leitura deste texto, uma pessoa terá morrido em
decorrência de Acidente Vascular Cerebral (AVC) — principal causa de
óbito no Brasil. A incidência aumenta em 20% no inverno e as regiões Sul
e Sudeste são as que mais somam casos de derrame. Prevenir o
aparecimento da doença é simples. Basta seguir as determinações da
boa saúde: alimentação de qualidade,
controle do colesterol, da pressão arterial, além de cultivar a prática de exercícios físicos e não fumar.
De acordo com o Datasus, o banco
de dados
do Ministério da Saúde, houve um crescimento de 64%
nas internações por AVC (Acidente Vascular Cerebral, popularmente
chamado de derrame) entre homens de 15 a 34 anos, e de 41% entre
mulheres na mesma faixa etária.
Para o neurologista Eli Evaristo, do Hospital das Clínicas da
Faculdade de Medicina da USP, a primeira causa para o aumento é a
melhora no diagnóstico. Mas colabora também o fato de que doenças como a
hipertensão - um fator de risco importante para o AVC - tem acometido
cada vez mais jovens. Alterações de hábito alimentar (consumo mais alto
de sal), o sedentarismo e
aumento da obesidade em jovens são alguns motivos para isso. Tabagismo,
diabetes, doenças cardíacas e uso de drogas também são fatores que podem aumentar o risco de derrame.
A dentista Paula Luz sofreu um AVC aos 27 anos, oito meses antes de
se casar. Ela estava prestando uma prova para entrar para a Marinha e,
ao sair da piscina, sentiu uma forte dor em um lado da cabeça e
tremores. O processo de reabilitação envolvia três sessões diárias de
fisioterapia. Ela teve que reaprender a andar e hoje, após uma longa
reabilitação, ela recuperou todos os movimentos.
O coração batendo descompassado e uma tosse insistente são alguns dos sintomas
mais frequentes
de quem esteve próximo a ter um derrame, como Maria Amelia Mello Pinho,
72 anos. Em meados de 2008, crises sucessivas de estresse fizeram com
que a aposentada saísse em disparada para o pronto-socorro, em Gravataí,
município da Região Metropolitana.
— Foi um susto. Precisei levar uns choques no peito e ser internada.
Depois desse dia, passei a tomar anticoagulante diariamente e controlar
mês a mês os níveis de coagulação do sangue — conta Maria Amelia.
O fato de ter as taxas de glicose, colesterol, e os níveis de pressão
equilibrados podem ter ajudado a livrar a aposentada de ter um AVC.
Sorte não desfrutada por 400 mil indivíduos a cada ano no país — o
equivalente ao número de habitantes de Caxias do Sul, a segunda cidade
mais populosa do Estado. Desses, até 30% morrem em seguida do ataque. Do
restante, 60% morre em cinco anos.
A principal causa do AVC isquêmico, o tipo mais fatal e que mais
deixa sequelas, é a hipertensão arterial. Para abordar o assunto e
trabalhar na prevenção, na quarta-feira passada foi celebrado o Dia da
Consciência Vascular, sob o tema Mantenha-se em Circulação.
— A forma mais simples de
resolver
é deixando a vida sedentária.Com isso, os outros índices vão se
ajeitando aos poucos — aponta Adamastor Humberto Pereira, presidente da
Regional Rio Grande do Sul da Sociedade Brasileira de Angiologia e de
Cirurgia Vascular.
Especialistas destacam que um dos principais erros cometidos pelos
pacientes é demorar para procurar ajuda. Logo após os primeiros
sintomas, cada minuto se torna precioso. Portanto, esperar que algum
familiar chegue em casa para tomar providências ou ir sozinho ao
hospital só atrasa o diagnóstico.
— O mais prudente é chamar a Samu, no 192. Esses profissionais estão
habilitados a orientar desde o telefonema e sabem quais hospitais são
mais indicados — explica a neurologista Sheila Cristina Ouriques
Martins, coordenadora da ONG Rede Brasil AVC, que tem sede no Rio Grande
do Sul.
Para o neurologista vascular Alexandre Pieri, responsável pelo
ambulatório de AVC da Escola Paulista de Medicina (Unifesp), a ausência
de sintomas, porém, não significa que a pessoa não tenha que se cuidar.
— Apenas um terço dos pacientes apresenta sinais de que estão tendo
um derrame, como falta de força de um lado do corpo ou distúrbios na
fala. Eles se assustam e vão ao médico. O restante não tem essa sorte. O
negócio é prevenir.
Novos medicamentos ajudam a prevenir
A indústria farmacêutica tem evoluído a passos largos no
desenvolvimento de drogas que ajudam a prevenir o AVC provocados por
fibrilação atrial — um dos tipos mais comuns de arritmia e responsável
por um a cada seis derrames. Após 50 anos sem novidades no segmento, uma
nova geração de anticoagulantes chegou ao mercado nesse mês. O primeiro
tem a dabigatrana como princípio ativo e já foi aprovado pela Agência
Nacional deVigilância Sanitária (Anvisa).O segundo, a rivaroxabana, já
está em fase final de estudos e pode ser liberado em breve. Em comum,
têm o benefício de quebrar um pouco a dependência do paciente com o
médico.
Para Gilberto Nunes, presidente da Sociedade de Cardiologia do Estado
do Rio Grande do Sul (Socergs), os níveis de prevenção do derrame são
praticamente os mesmos dos que já existem. As vantagens estariam na
comodidade.
— As drogas dispensam os tradicionais exames de sangue para controlar
os níveis de coagulação e também não interagem com outros medicamentos
ou alimentos que contenham a vitamina K, como alface e brócolis. Mas tem
um fator limitante, que é o preço (cerca de R$ 250).Ele é bem aplicado
naqueles pacientes que não tem responsabilidade ao fazer o tratamento.
Aderir à risca às prescrições do médico é crucial. Poucos o fazem. Um
pesquisa recente realizada em parceria com a ONG Rede Brasil AVC
constatou que apenas 8% daqueles que tiveram derrame estavam utilizando o
medicamento.
Números da doença
:: Incidência
- 1 em cada 6 pessoas terão o problema, estima a Organização Mundial de AVC
- 70 mil brasileiros morrem de AVC todos os anos — essa é a doença que mais mata no país
- 1 em cada 10 pessoas que sofreram um AVC tem outro ataque nos 12 meses seguintes
:: Tipos
- Em 85% dos casos, o AVC é isquêmico, quando um coágulo ou placa de
gordura se instala em uma das artérias cerebrais, reduzindo ou impedindo
a circulação sanguínea. Este coágulo pode se originar diretamente no
cérebro, ou tem origem no coração ou nas artérias carótidas ou
vertebrais e depois migrar para o cérebro.
- O AVC hemorrágico é caracterizado pelo rompimento de um vaso sanguíneo, desencadeando uma hemorragia no cérebro.
:: Progressão
- A cada hora sem tratamento, são perdidos 120 milhões de neurônios - ao todo o cérebro tem cerca de 90 bilhões dessas células.
- Após o AVC, o cérebro usa sua capacidade de plasticidade neuronal
para fazer com que outras áreas assumam as funções de coordenação
executadas pelos neurônios danificados.
:: Corrida contra o tempo
Quanto mais rápido o atendimento, menor o dano. O que deve ser feito:
- Até 4,5 horas após o início: pode ser dado o medicamento
trombolítico, que irá estimular o organismo a destruir o trombo e
reduzir em até 30% as sequelas. Porém, apenas 5% chegam a tempo. Além
disso, a droga não pode ser aplicada em pacientes suscetíveis a
hemorragia.
- De 4,5 horas a 8 horas após o início: é feita a terapia
interarterial, na qual um cateter é usado para facilitar a destruição do
trombo.
AVC hemorrágico
- Não há medicamento. O que se deve fazer é controlar a pressão sanguínea nas primeiras horas para evitar que a lesão aumente.
Kamila Almeida